terça-feira, 23 de dezembro de 2014

A NASCENTE



No tatear encantado,
Eu rabisco em cores azuis
Pelas folhas ao vento
Das letras garrafais.
(daquilo que nos distancia)

Na sensibilidade,
A minha saudade.
Na ausência,
A minha paciência.

Eis que me basta a tua inteligência
Para que eu lhe faças uma reverência.
Eis a minha única lembrança,
Antes da minha nascença.
Eis que desejo a tua presença
Para que eu viva em esperança.

sábado, 20 de dezembro de 2014

Haja ou Aja?

Zombarão,
Arrombarão,
Até você, Barão?

Haja razão!
Haja coração!
Haja, haja...

Não! Aja, aja!!!

CHUVA, CHUVA

Essa leveza
Que transpõe a sutileza
E desperta a beleza
Me desperta..

Ao som da trovoada,
Com uma chuva abençoada,
De notas cantaroladas,
Fico cá encantada...

Espero ansiosa, a noite morrer,
Despida do seu véu ao escurecer.
E, assim, adormecer
Para, finalmente, o dia alvorecer..

CARPE DIEM


Tempo, você não me prende
Entre seus dedos,
Enquanto eu escoo,
Você se abate.

Tempo, você é como uma parede,
Enquanto eu o transpasso,
Como num passo,
Você pra lá pende.

Tempo, você não sofre,
Eu sou o passado, o presente e o futuro
De tudo que luto,
Você, de tão vivo, morre...

GRANDE AMOR

Ah! Grande amor,
Deixa de ser imenso,
Quando deixa de ser manso
E espalha a dor.

Apenas vejo aquele sofrer,
Nem as nuvens cobrem
As gotas que despencam
Do seu olhar ao entristecer.

Vejo aqueles olhos de paixão
Despetalados, sem emoção,
Rastejando-se pelo chão
Procurando um outro coração.

Há de se ter compaixão,
Diante da beleza e da sutileza
Da sua própria natureza
Para que não perca a esperança
De um novo dia renascer.

SUSPEITOS, SUSPIROS!


Oh! Angústia,
Diante dos dias
Que se passam...
Ah! Timidez,
Que não me diz
E com os olhos falam...
Oh! Poder,
que não deixa viver
e nos distanciam
Para que amar,
Se não há
O seu olhar
A me cercar?

quarta-feira, 22 de outubro de 2014

Rubem Alves - Futebol e Política




Alguns amigos se juntaram e resolveram fazer algo pela pequena cidade do interior em que moravam. Pensaram que seria possível colocar um pouco de razão nessa coisa tão movida a paixões que é a política. Nada partidário. Não levantaram bandeiras. Não defenderam candidatos. Não gritaram slogans. Propuseram aos dois candidatos a prefeito que respondessem a uma série de perguntas sobre os seus planos, as mesmas perguntas para os dois. As perguntas foram feitas por escrito e eles tiveram dez dias para escrever suas respostas. As perguntas e as respostas, com a concordância de ambos, foram transformadas num tablóide e distribuídas pela população.
Num dia previamente marcado, os dois candidatos deveriam ler as suas respostas e assiná-las, como um documento público. Assim aconteceu. Os dois candidatos compareceram ao local designado junto com seus partidários, que se assentaram em dois blocos de cadeiras separadas. Mas o que sucedeu nada teve de racional.
Era mais como o confronto entre torcidas de dois times de futebol, cada torcida odiando a outra. Vaias, gritos apupos, xingamentos. Ninguém estava interessado em ouvir e compreender o outro. O clima foi ficando tenso e havia a possibilidade de que, terminado o evento, houvesse um confronto físico entre os dois grupos, tal como frequentemente acontece com torcidas de futebol. Ao final, a palavra foi aberta aos presentes. Uma amiga, uma mansa mulher, se levantou trêmula e disse algo mais ou menos assim: "Eu e meu marido nos mudamos para cá por opção. Cansados da brutalidade de São Paulo, escolhemos esta cidade porque ela nos pareceu habitadas por pessoas cordiais e pacíficas. Mas agora estou triste. Perdemos nossas ilusões..." Disseram alguns participantes que foi essa fala mansa que envergonhou as torcidas já preparadas para a briga. Que pena que aconteça assim!
              Usando a metáfora do futebol: as eleições não são um confronto entre dois times que se odeiam. Não há dois times. O time é um só. Todos jogamos nele. Nosso time é a cidade. O que acontecer na cidade acontecerá a todos nós. O que acontece nas eleições é a escolha do técnico do time no qual todos nós jogamos. Dizem as Sagradas Escrituras que uma cidade dividida contra si mesma não pode sobreviver. Será esse o nosso destino, viver batalhas de ódio que só produzem divisões? As pessoas, por terem ideias diferentes, têm de se tornar inimigas? Alguns acham que sim. Elas se tornam inimigas daqueles que têm ideias diferentes das suas. Eu mesmo ganhei muitos inimigos... Isso acontece porque há aqueles que se julgam possuidores da verdade. Mas ninguém é dono da verdade. Por isso existe a democracia: porque ninguém tem a verdade. Só temos opiniões precárias. Quem se julga dono da verdade tem de ser intolerante.

(Retirado do Livro "Ostra feliz não faz pérolas".)

domingo, 6 de abril de 2014

Espaços


Sutilmente estou vazada
De onde vem a minha leveza
Preciso de me preencher
Aromas para me encher
Com todas as flores e cores

Sinto-me vazada na alma
Com orifícios expostos
Todos os buracos, adentro
Exponho-os distintos

Preciso me fixar
Para não me asfixiar
E me sufocar,
Preciso me focar

Preencha-me em todos os lados
Surpreenda-me com suspiros
Levemente profundos
E, assim, preenchida me retiro

domingo, 9 de fevereiro de 2014

TU ÉS


Roubaste a minha alma e meu corpo.
Diante da transitoriedade do teu olhar,
Escravizaste-me no que mais sutil eu possuía:
Não me possuo mais.

Vivo do teu reflexo,
Vivo das tuas migalhas jogadas ao chão
As chagas se abrem e se fecham
Como a dança das lavas do vulcão
Ativo e em erupção.

Devoro-te
Possessa
Com ardor e dor
Sangro e assopro
Devoro-te

Tiraste de mim
O que me aprecia:
A minha paz.
E com a pá,
Enterraste-me aos teus pés
Cavaste dentro de mim.

Quem és tu?
Que me alimentas e me fazes devorar
Jogada na lama
Da incerteza do indefinido
Plano infinito
Possuíste-me

Devoro-te arrebatadoramente
Devolva-me o que me é de nascimento
Minha alma que subjugas
No calor dos teus pés
Esfrangalhas-me com um suspiro
Arrematas-me e me matas.

Quem és tu?
Que me matas um dia
Que me libertas em outro
Que me aprisionas ali
Que me fazes renascer aqui
Quem és tu?